Todo mês, mais ou menos 10 dias depois da lua cheia, a praia de Waikiki é invadida por milhares de águas-vivas havaianas da espécie Carybdea alata. São as box jellyfish, transparentes e altamente tóxicas.
Seu veneno está concentrado nos nematocistos, células urticantes que ficam nos tentáculos da água-viva e que são capazes de bombear a substância tóxica depois de expelida na presa (ou na sua pele humana de cidadão despreparado). Os tentáculos das águas-vivas são extremamente sensíveis e, quando tocados, são os nematocistos que sinalizam a liberação destes túbulos microscópicos rapidamente injetados na vítima/presa. Verdadeiro mini-míssel mortal.
As águas-vivas de Waikiki
Só em Waikiki, as box jellyfish são responsáveis por centenas de queimaduras todo ano – queimaduras estas que podem ser remediadas de início com água morna e vinagre, diga-se de passagem, porque denaturam temporariamente a toxina. Esta toxina possui em altas concentrações a hemolisina, uma proteína que permite a formação de poros na membrana das hemácias. Com as hemácias “furadas”, a hemoglobina vaza e gera aquele vermelhidão que a queimadura da água-viva produz. Interessantemente, peixes são mais resistentes à ação da hemolisina, porque suas hemácias possuem núcleos, diferente da dos mamíferos que são anucleadas. Food for thought.
Acredita-se que a regularidade da invasão de águas-vivas em Waikiki (e na realidade, por toda a costa sul da ilha de Oahu) é parte de uma agregação reprodutiva: elas andam em grandes grupos e suas gônadas estão maduras para a reprodução. Como elas vêm aos montes, a prefeitura de Honolulu coloca placas nas praias, nos dias de box jellyfish, para que os banhistas fiquem alertas. Afinal, ninguém quer se queimar, nem o turista nem o governo. 😉
Dicas para fotografar águas-vivas
Claro, há exceções. Em janeiro passado, no dia de influxo máximo de água-viva em Waikiki, lá fomos eu e André de madrugada fotografá-las, como parte da documentação de uma pesquisa do Laboratório de Cnidários do Pacífico. Para nos protegermos dos tentáculos urticantes, estávamos de roupa de neoprene completa, luvas e bota até o tornozelo, nenhum pedacinho de pele sequer à vista. As águas-vivas vêm até a praia, então não precisávamos ir pro fundo para vê-las. Sinceramente, eu me impressionei com a quantidade delas, são milhares. A cada passo que eu dava na água, via pelo menos umas dezenas ao redor, tentáculos enroscando na minha perna de neoprene.
Mas não deixou de ser uma aventura interessante. Na madrugada, quase ninguém se surpreendia com a vista de pessoas em neoprene completo na água. Mas à medida que o dia amanhecia, turistas começavam a chegar perto e perguntar porque esteavamos vestidos daquele jeito – e eu, tendo visto o número absurdo de águas-vivas que estavam ali sem as pessoas perceberem, enfatizava para que eles não entrassem na água se não quisessem estragar as férias.
Afinal, queimar a largada assim não é legal.
Tudo de bom sempre.
P.S.
- Resolvi escrever este post porque saiu hoje um podcast do Encyclopedia of Life sobre o assunto comentando sobre águas-vivas e citando nossa galeria ArteSub. 🙂
- Para ler mais curiosidades havaianas e dicas de viagem, veja a página com a lista completa de posts sobre o Havaí.