Aniversário em tons de azul gelo

por: Lucia Malla Antigos, Brasil, Comes & bebes, Mallices, São Paulo, Viagens

Aniversário Azul Gelo

Quem me conhece sabe que eu adoro aniversários. Não só o meu, mas de qualquer pessoa. Celebrar é mote básico para o seu dia, seja ele quando for. E para o meu aniversário, comecei a pesquisar em novembro algo diferente para fazer em São Paulo. Achei no ótimo blog da Débora e do Fernando a maluquice perfeita: entraria literalmente numa fria.

Quem me conhece também sabe que eu detesto frio. Desde os idos tempos em que morei na Alemanha, frio é algo que me entristece. Adoro ver neve, vestir casacos, mas detesto a sensação de gelado, aquele vento cortante no seu rosto, me deprimo com o silêncio do inverno.

De modo que a primeira reação que todos os meus amigos tiveram ao saber que eu decidira comemorar meu aniversário num bar de gelo foi surpresa total. Um misto de descrédito e estupefação com escolha tão bizarra, principalmente vindo de mim.

Meu aniversário chegou e à noite estávamos eu e André no Ice Espaço, espécie de câmara frigorífica dentro do ArteEspaço, um barzinho interessante na Vila Madalena. O bar “quente” (na realidade à temperatura ambiente) é como outro qualquer: drinques, um palquinho para shows e ar descolado de modernidade. No cantinho direito, fica a entrada pro Ice Espaço. Uma vez pago o ingresso, você pode entrar no gelo quantas vezes quiser, mas não pode ficar mais de 30 minutos contínuos lá dentro – os donos provavelmente não querem ninguém hipotérmico indo para um hospital. It’s not good for the business.

Há uma ante-sala, espécie de “preparação”, cuja temperatura é em torno de 4ºC – o mesmo que uma geladeira. Ali, a gente veste o casacão, as luvas e as botas que o Ice Espaço oferece. E já começa a se acostumar com o que vem pela frente.

A entrada do Ice Espaço no cantinho do bar “quente”. Vemos os cabides com casacos à direita da foto, em frente à porta de entrada.

O bar de gelo por dentro. A decoração muda de tempos em tempos – afinal, é tudo uma grande escultura de gelo.

Então você entra no bar gelado propriamente dito. Com direito a um drinque qualquer feito à base de vodka ou Curaçao blue, bebidas com alto teor alcóolico que não congelam a -10ºC, que é a temperatura constante dentro da câmara fria. A sensação é bizarra. Veja bem: meu mestrado foi estudando resistência ao frio em camundongos, o que significa que passei boa parte do meu tempo de tese dentro de uma geladeira, fazendo experimentos, e sentindo mais frio que os bichinhos. (Por sinal, os camundongos, são mais resistentes que nós, humanos, ao frio, já que o tecido adiposo marrom deles produz calor de forma mais eficiente. Nós nem tecido adiposo marrom como órgão estruturado temos…)

O bar e a decoração apropriadíssima de pingüim.

Tudo é estranho no Ice Bar. O ambiente tem luzes azuladas, os blocos de gelo formam paredes, balcão e poltronas. O copo é também feito de gelo, e gruda um pouco nos lábios quando vamos tomar o drinque. O copo aliás, escorrega fácil das mãos. As poucas pessoas que estão ali quase não conversam, mais se encolhem e deixam o som do technomusic os envolver. Como é um ambiente fechado, não há o vento, inimigo número 1 do inverno temperado, que leva a sensação térmica ao mínimo. Ali não: -10ºC são -10ºC e ponto. Mas o mais estranho de tudo foi a minha reação a toda a experiência mesmo: eu adorei a exposição aguda ao frio. É realmente uma relação de amor e ódio que eu tenho com as baixas temperaturas, que nem Freud deve conseguir explicar direito (enfrentar medos? vício em adrenalina? o prazer do desafio?) Fiquei no Ice Bar dançando, curtindo o ambiente, dando risadas e congelando a mão, com os olhos brilhando de felicidade. Me diverti muito com aqueles 30 minutos de Alaska em São Paulo. Quando o barman avisou que nosso tempo acabara, eu fingi não ter ouvido e quis ficar mais, curtindo o momento polar. Entrar numa fria, afinal, não é sempre sinônimo de roubada.

Pode ser simplesmente sinônimo de um aniversário de arrepiar. De frio. 😀

Tudo de gelado sempre.

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– Eu já tinha visto um Ice Bar em Auckland, na Nova Zelândia e sabia da existência de um em Seul. Mas nunca tinha ido em um. E não é que é divertido?

– Como não poderia deixar passar, perguntei, é claro, sobre o consumo de energia do bar. Usam 2 geradores elétricos para manter a temperatura baixa na câmara fria. A ante-sala serve de “buffer zone” para diminuir o gasto energético, mas a conta de luz ainda é bem alta. Como numa câmara frigorífica pequena, aliás.

– Demais capitais brasileiras, aguardem: a mocinha do Ice Espaço me contou que eles estão montando um bar de gelo móvel, num caminhão frigorífico, que percorrerá o Brasil levando a experiência antártica até o nordeste. É o Brasil embarcando numa fria.

– Esse post não é patrocinado. Eu é que ando de cabeça muito quente com outras preocupações e resolvi contar aqui uma experiência exemplar da minha nonsense atual. Tudo em nome de esfriar a cabeça, literalmente. 😀



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