O lixo pelo mundo

por: Lucia Malla Alemanha, Brasil, Comportamento, Ecologia & meio ambiente, Economia, EUA, Havaí

Saí do Brasil pela primeira vez para um estágio em Potsdam, Alemanha (ex-Alemanha Oriental). Cidadezinha ajeitada a 30 minutos de trem de Berlim, cheia de castelos suntuosos e ruas organizadas, e que havia sido destruída completamente durante a Segunda Guerra Mundial. E com o suor restante da dor da separação que as Alemanhas sentiram por tanto tempo, visto que sua fronteira com Berlim Ocidental era um lago não muito largo. (Acho que caberia um post inteiro um dia para elogiar essa delícia germânica.)

Com os olhos deslumbrados de quem nunca havia tido a experiência internacional antes, muitas coisas me maravilharam naquelas primeiras 24 horas do verão alemão de 1997. Entretanto, devo confessar que o que mais me chamou a atenção ali, naquele meu primeiro dia foi… o lixo. Sim, o lixo.

Lixo pelo mundo

Talvez seja melhor dizer nesse caso a falta de lixo. Ou a organização metódica da coleta do lixo. Eu morava num prédio de alojamento estudantil de 6 andares, 24 apartamentos/andar, e no estacionamento, uma área separada designava as grandes latas de lixo para os moradores depositarem seus restos de consumo. Eram 8 tipos de lixo diferentes: papel, plásticos, vidro verde, vidro marrom, vidro branco, metal, orgânicos, e o resto. Foi minha primeira experiência com reciclagem de lixo, e toda a teoria que eu tinha ouvido tanto em aulas de Educação Ambiental havia de repente tornado-se uma realidade: eu tinha que reciclar.

(Lembro dias depois de uma discussão durante o almoço em que meus colegas de trabalho reclamavam desse sistema, pois “gerava muitos lixos menores dentro de casa”. Eu, mal-chegada do Brasil, decidi que não mencionaria os efeitos que a ausência de um plano de reciclagem do lixo pode gerar na sua cidade. Talvez fosse chocar demais meus novos colegas.)

Fato é que desde que tive esse primeiro encontro com um mundo onde reciclagem de lixo não era só teoria de sala de aula, e vendo os benefícios diretos que a reciclagem trazia (maior conscientização, limpeza urbana, etc.) reparo especialmente nos programas de coleta de lixo dos lugares onde vou. Ok, todos estão carecas de saber que o advento do lixo é diretamente proporcional ao consumo de uma sociedade, que podemos diminuir o consumo de um monte de porcaria, blábláblá… Mas eu acredito que muito mais que a geração do lixo, é a forma como processamos o mesmo DEPOIS de criado que faz a diferença pra nós no momento.

Ao voltar pro Brasil, depois do período na Europa, resolvi prestar mais atenção para o lixo que produzia. Sem necessidade de muitos comentários: em Vila Velha (ES), Rio de Janeiro e São Paulo, lugares onde morei, a reciclagem era praticamente inexistente. (Moradores dessa cidade, como anda a situação atual da coleta de lixo nesses locais? Por favor, me reciclem de informações!)

E aí fui morar nos EUA em 2000. Outro choque: o consumo exacerbado, a descartabilidade das coisas todas, o lixo que se acumulava em proporções que eu não havia presenciado até então. Não sei os dados atuais, mas não duvidaria muito de alguém que me dissesse que os americanos são os maiores geradores de lixo do planeta. Há um tempo atrás, os dados eram de que americanos eram os geradores de ~25% do lixo mundial. Entretanto, em Boston, tínhamos em casa uma grande caixa de plástico onde tudo que pensássemos ser possível reciclar era colocado (não havia regras de separação), e uma vez por semana o caminhão da reciclagem passava e coletava tudo que estava naquela mega-caixa de plástico. Um sistema que é a cara do comodismo americano: recicle em casa a seu belprazer, alguém toma conta do resto pra você no seu portão, a um preço no final, é claro. Mas pelo menos, reciclava-se.

O choque mesmo veio quando me mudei de Boston para Honolulu. Veja bem, todos sabem que numa ilha, espaço é um bem caro. Portanto, quanto mais lixo, maior o problema espacial. E o programa de reciclagem havaiano… dava vontade de rir. Era apenas: junte na sua casa o que você acha reciclável e leve você mesmo a um trailler de triagem numa escola – existiam poucos desse trailler na ilha toda. Ou seja, faça você mesmo tudo, do início ao fim. Poderia ser comparado ao alemão, com o detalhe da distância percorrida de casa até o lixo: enquanto na Alemanha eu andava uns 30 passos, no Havaí precisava ir de carro até um ponto X. Afirmo que, conhecendo a sociedade americana, esse não é um programa efetivo de reciclagem. Além disso, o excesso de lixo que os havaianos produzem (e é inacreditavelmente demais) é em parte queimado (fornecendo ineficientemente um pouco de energia para a ilha) e a outra parte levado para o continente, para algum estado no meio-oeste ou para alguma ilha do Pacífico, talvez, (como as Ilhas Marshall) que aceite em troca de um belo cheque a “hospedagem” do lixo do estado/país alheio. Será que as pessoas acreditam mesmo que o custo-benefício de mandar o lixo num navio pra sei lá onde é mais vantajoso que reciclar o que for possível, gerando inclusive adubo?

E aí chegamos na Coréia do Sul. Aqui, assim como na Alemanha, a área de reciclagem fica ali na esquina, no estacionamento do condomínio e está dividida em: metal, plástico grosso, plástico fino, papel, vidros, isopor, orgânico e o resto. Todos os domingos, deixamos lá nossa parcela de contribuição à melhoria do ambiente nesse país pequeno e de certa forma “ilhado” no mundo. Aqui acrescenta-se um ponto ainda: todos os lixos “comuns” (que não são reciclados) têm que ser colocados em sacolas especiais com a identificação do município, de forma que cada sacola é levada pro “lixão” da cidade a que pertence. O lixo é identificado. Essas sacolas custam alguns wons (e multa se você não as usa!), sendo portanto um incentivo à reciclagem: gaste menos sacola e economizarás no seu orçamento.

E pro Brasil? Bem, não sei a quantas anda o programa de reciclagem no Brasil – não costumo conversar sobre lixo com ninguém, pra ser sincera. Da última vez que estive no país, em 2003, era muito pouco que se fazia pelo lixo. Apesar do Brasil ser o país que mais recicla latinhas de alumínio no mundo, durante os muitos anos que morei no Brasil, o único programa de reciclagem que ouvia falar era o de Curitiba ou então as discussões teóricas que nunca saíam do papel. Eu acho que qualquer reciclagem é melhor que nenhuma. Faz bem pro bolso e pra alma do cidadão. No meio de todas essas diferentes experiências vividas em diferentes países com a questão do que fazer com tanto lixo, ficou patente para mim que a organização de um programa de reciclagem ameniza bastante o bolso do cidadão, mesmo que indiretamente, e gera esse espírito de “cidadania”, a boa sensação de estar contribuindo para a melhoria das condições do ambiente ao redor. Além de gerar empregos para uma parcela da população em usinas de reciclagem.

Conformemo-nos: em menor ou maior quantidade, geraremos lixo. Temos é que tratá-lo de forma adequada e sem prejuízo ao ambiente do planeta.

Tudo de bom sempre.



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