Desconferência

por: Lucia Malla Antigos, Blog, Blogosfera & mídia social, São Paulo

Eis que estive no Blogcamp em São Paulo neste fim-de-semana. Quer dizer, só fui no sábado, já que no domingo me entreti em um almoço com sogros e um casal de taiuaneses – que nos receberam em Taipei, quando lá estivemos.

Mas eis que eu caí no Espaço Gafanhoto de pára-quedas, em um campo de pouso repleto de caça-paraquedistas naquele momento. Fui disposta a ouvir muito mais que falar, a aprender com a experiência alheia, e extremamente cética quanto ao modelo de desconferência – afinal, em toda minha vida sempre fui a conferências, onde a organização prévia principalmente dos temas a serem abordados era cristalina. A desconferência, no fim das contas, me surpreendeu: o modelo funciona.

Assim que chegamos, enquanto tomávamos sucos, algumas pessoas iam espontaneamente colocando em um quadro branco o que elas achavam que deveria ser discutido naquele dia. Num primeiro momento, todos se reuniram na sala principal para ouvir as boas-vindas dos organizadores, entre eles a xará Lúcia. Depois, um mocinho carioca começou falando do Wasabi, um agregador de conteúdo que eu não conhecia, e sinceramente, não tive vontade de conhecer: agregação demais pro meu gosto internético light.

Resolvi me encaminhar para a edícula (off-topic:acho essa palavra muito estranha) da casa, onde meu amigo Marmota parecia comandar uma discussão sobre o perfil do leitor de blogs. Estava cheia a sala, e eu fiquei do lado de fora, acompanhando as discussões (e torrando ao sol) pela janela. Além do Marmota, não conhecia ninguém. A discussão foi interessante, mas em vários momentos eu tinha a impressão de estar lendo um emaranhado de posts de uma vez só: as idéias já haviam sido ditas em algum recanto da internet, e foram ali recicladas, para a versão ao vivo e a cores. Sinal de maturidade, sem dúvida. Mas eis que a discussão descambou pro fatídico caso da campanha do Estadão contra blogs (que aparentemente só eu não conhecia direito – eu sou mesmo uma avoada) e deixaram o mocinho do Estadão falar um pouco. Edney fez a pergunta-chave pro moço: “Você está aqui representando o jornal ou a si mesmo? Por que eu diferencio bem as duas coisas”, numa tentativa light de deixar o moço mais confortável para falar o que quisesse. Entretanto, o moço foi infeliz, e enrolou bastante na resposta, deixando a entender que representava, de certa forma, o Estadão. Fiquei com pena dele, que ao final da roleta russa estava com os olhos lacrimejantes.

Saí pro almoço com Marmota, Doni, Edney e Ian Black. Edney é mesmo um fera. Basta conversar com ele alguns minutos para percebermos o quanto ele entende desse mundo virtual sem porteira – e para mim, uma analfabytica, ele é o que mais facilmente consegue converter toda a dificuldade da web em palavras simples, que eu, leiga no tema, entendo. Já o Ian Black foi a maior surpresa do Blogcamp. Ele é completamente diferente do que minha imaginação elocubrava lendo o blog dele: ele é um doce de pessoa, educado, de fala mansa e muito gentleman, daqueles que puxam a cadeira das damas na hora de sentar. Adorei conversar com ele, trocar idéias sobre livros e afins. Aproveitando que era McDia Feliz, comi um Big Mac para ajudar as crianças com câncer – e colaborar na aquisição de um, ingerindo aquele plástico que eles chamam de pão.

Depois do almoço, voltamos ao Espaço Gafanhoto e eu voltei também à edícula da casa, para discutir agora sobre blogs sociais. Ouvimos algumas experiências interessantes, e a que mais me chamou a atenção foi a do Observatório do Tietê, mas infelizmente não anotei o nome do mocinho responsável para linká-lo aqui (e não achei no Google). O projeto incita as próprias crianças que moram nas proximidades do rio Tietê a reportarem como estão as condições do rio naquele momento, e fazer uma análise mais geral da água. Ecologicamente envolvente.

Algo porém me deixou um pouco frustrada, e acredito que isso seja muito pelo meu jeito de ser aliado à minha formação científica, extremamente preparada para ouvir todos os lados: as pessoas, durante as discussões, em geral não respeitavam o dedo levantado, sinal clássico de que alguém quer falar. Elas simplesmente falavam, interrompendo algumas vezes o discurso alheio. Talvez isso também faça parte do “ser uma desconferência”, e eu que devesse ter me adaptado. Enfim.

A desconferência fechou no sábado de forma não muito agradável: roubaram o projetor de slides do Espaço Gafanhoto enquanto tínhamos ido almoçar – a suspeita maior é de que alguém tenha entrado enquanto a casa estava vazia. Quando o Ina me falou, achei que era brincadeira, mas não, infelizmente era sério. Caos urbano da segurança sob nossos olhos. Triste constatação.

Depois de discutir o que seria feito para repor o projetor, fomos ao esperado momento happy hour no Pinheirinho. A mesa era enorme, e obviamente não dava pra papear com todos. Conversei bastante na mesa de bar com o casal responsável pelo Ouvindo.com, um blog profissinalizado de músicas. Eles me alertaram sobre segurança na web, e discutimos muito as questões ecológicas da pesca e abate de animais – finalmente, pude abrir o verbo sobre a minha praia, já que durante o dia inteiro eu basicamente só ouvi e nada falei. Eles são ótimos, e desejo sucesso ao empreendimento musical que planejam. Depois conversei com 2 mocinhos que esqueci o nome, sobre viagens – mais uma vez, a minha praia. E no fim, eu e Ina ficamos falando de blogs um pouco mais, e ele tentando convencer Tiago Dória a abrir outro blog – não me perguntem o tema.

No resumo da desópera, eu achei boa a reunião. Muito voltada para a profissionalização dos blogs, monetização e afins (um papo que ainda não digiro muito bem), com uma maioria gritante de blogs de tecnologia que muitas vezes traziam a discussão para um patamar ininteligível para mim (uma sopa de letrinhas de widgets e afins), mas também muitos discursos sociais, experências legais que estão dando certo em comunidades carentes e cidadezinhas minúsculas do interior. Um modelo de comunicação, sem dúvida. Para mim, valeu a oportunidade de conversar e conhecer pessoas antenadas com o que vem por aí. É sempre legal compartilhar experiências. E as desexperiências, numa desconferência.

Tudo de bom (des)sempre.



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