No final de 2007, o Bender pediu aos colaboradores que publicaram mais que X posts no Goitacá para escolherem um presentinho de Natal que seria “cortesia” do blog coletivo. Depois de muita dúvida, escolhi o livro “Em busca do sonho – Vinte anos de aventuras da Família Schürmann”, de Heloisa Schürmann. Após ler o livro, confirmo meus instintos: não poderia ter escolhido melhor.
Por que gostei do livro
Em primeiro lugar, porque a cada linha de “Em busca do sonho”, dá vontade de sair pelo mundo viajando. Só isto para mim já é uma reação tão natural quanto respirar. O livro só a reforçou ainda mais.
Em segundo lugar, porque é o relato de uma aventura única, e contado de uma forma tão simples: uma família (pai, mãe, 3 crianças) decidem comprar um veleiro e sair pelo mundo navegando, largando bons empregos e a tão idolatrada “estabilidade” (aos moldes do sistema de gado marcado, entenda-se bem, porque a opinião pessoal que capturei no livro é de que a família Schürmann é provavelmente uma das mais estáveis do planeta).
Em terceiro lugar, pelos desafios mostrados, como solucioná-los – ou não. Quer maior pesadelo logístico que uma volta ao mundo de veleiro? Como educar crianças num barco? E se a comida acabar? Como fazer se o barco pegar uma tempestade pesada? E se alguém tiver dor de dente ou passar mal? Claro, levaram 10 anos para os Schürmann se prepararem fisica e mentalmente para a saída no dia 13 de abril de 1984 rumo aos mares do planeta – depois, mais 10 anos vivendo no mar, reverenciando cada momento maravilhoso, compartilhando histórias. Requer determinação e coragem maiores ainda para continuar fazendo por toda a vida, ou seja, afirmar a escolha. Afinal, a vida no mar não é simples, e como a própria Heloisa coloca…
“Cada dia era uma lição de paciência, de saber ouvir, dividir tarefas e compartilhar o exíguo espaço do barco.”
Em busca do sonho em três partes
O livro divide-se em 3 grandes partes:
- os 10 anos da primeira aventura no mar (1984-1994);
- a viagem em que eles refizeram a rota do navegador Fernão de Magalhães (1997-2000);
- uma velejada pela costa brasileira para comemorar os 20 anos de família Schürmann no mar – essa última expedição contada muito en passant a meu ver: eu queria saber todos os detalhes possíveis e imagináveis da Heloisa, e ela só escreveu poucas páginas!
Confesso também que meu interesse inato pelo Pacífico me fez achar muito mais interessante os capítulos em que ela relata a estadia pelas ilhas e atóis da região, o dia-a-dia nesses lugares: Vanuatu, Samoa, Guam, Kiribati, Kosrae e mais um monte de ilhotas esquecidas. Vários exemplos da diversidade cultural que a gente nem sonha existir pelo mundo, sumarizados afinal em um jeito de escrever tão leve, tão emocionante. Lindíssimo. Dá mesmo vontade de largar tudo e comprar um barco e sair pelo mundo a navegar.
A dificuldade da vida no mar
Mas é claro, sempre há a tempestade. E são nesses momentos, portanto, que Heloisa Schürmann deixa bem claro o quão complexa, diligente e paciente a escolha por um veleiro precisa ser:
“A vida no mar não admite preguiça, esquecimento, adivinhações, negligência, procrastinação e excesso de confiança. Se alguma coisa precisa ser consertada, faça logo. Se um procedimento de segurança der mais trabalho que outro não tão seguro, opte pelo mais trabalhoso. Ou se for preciso verificar algum mecanismo duas vezes, verifique três. E, o mais importante de tudo, se você acha que é mais esperto que a natureza, fique em casa.“
Qualquer pessoa que lide com o mar o mínimo possível sabe que no mar a lei número 1 é a paciência. É o mar quem dá as regras e não você. Essa é uma das muitas maravilhosas mensagens que a Heloisa passa com um toque tão delicado, sensível. Li o livro durante minhas pedaladas diárias na academia e me peguei chorando em diversas passagens (desidratando por duas vias), pela emoção compartilhada de forma tão humana ao se realizar um sonho de maior grandeza – felizes àqueles que sabem o que é isso, realizar sonhos.
Conhecer seus limites – o maior desafio da vida
Muito mais que conhecer novas pairagens, é o conhecer seus limites que Heloisa mostra ser o grande desafio da vida. Além disso, saber o momento certo de atacá-los, ultrapassá-los, para se tornar um indivíduo melhor. Sair da “zona de conforto” no momento adequado. Ou ainda, optar por ela de uma forma inusitada. São desafios. Que cada um escolhe para sua vida da forma que mais lhe apraz. Os Schürmann mostram enfim que muitas vezes o limite de nosso sonho é o nosso próprio comodismo, a nossa própria inércia em não querer se aventurar pelo novo.
Deixo aqui um agradecimento especial a Heloisa Schürmann por escrever seu livro, compartilhar tal experiência grandiosa e me fazer viajar junto com ela por praias tão emocionantes. Roubo as palavras de Mário e Bárbara, amigos paulistas do casal Schürmann, para afinal manifestar meu apreço pelo que li em busca do sonho:
“Foi ótimo descobrir o quanto é bom viver com os nossos ideais.”
Tudo de bom sempre aos Schürmann. E que venham mais aventuras! 🙂
Leia mais: Minhas outras resenhas de livros.