por:
Lucia Malla
Estados Federados da Micronésia, Ilhas, Mergulho, Micronésia, Viagens
Publicado
16/01/2008
Última atualização de “Os naufrágios do Truk Lagoon”: 07/agosto/2019
Há algum tempo, André teve a oportunidade de visitar um desses locais perdidos no meio do Pacífico: Chuuk – ou Truk, vocês escolhem como falar. A confusão, entretanto, começa exatamente no nome do lugar.
Chuuk é o nome atual e significa “montanha” em língua chuukesa. Truk é o nome antigo, uma pronunciação mal-feita de Ruk, mas que continua sendo usado como se nada tivesse mudado. De qualquer forma, Chuuk é uma das ilhas que formam os Estados Federados da Micronésia, país que se fez independente em 1986, através de um Pacto de Livre Associação com os Estados Unidos. Ou seja, na prática, Chuuk ainda depende – e muito – dos americanos.
A influência americana em Chuuk
Mas a população de Chuuk é um pouco diferente das dos demais países-ilhéus do Pacífico com os quais os americanos lidam. Os chuukeses são considerados os menos simpáticos dos povos do Pacífico (aos americanos, entenda-se). Apesar de viverem do turismo, esforçam-se pouco para agradar os que lá chegam.
E é claro, num movimento característico da diplomacia americana, ao assinar o Pacto, Chuuk foi invadida pelos produtos americanos. Com isso, sofreu uma mudança em seu estilo de vida de pesca-e-côco para cheetos-e-coca-cola. Má alimentação e pouco exercício tornaram-se regra. E Chuuk é, portanto, mais uma ilha do Pacífico afligida pela epidemia de diabetes tipo 2, infelizmente.
Chuuk também recebeu verba para melhorar suas estradas e desenvolver a cultura do carro. O governo resolveu então fazer um plebiscito para decidir sobre a melhoria da estrada que corta as ilhas. Para surpresa de todos, venceu o “não”. Então o governo pegou a verba e comprou um barco a motor para cada família do país.
Hoje, a situação mais comum (e surreal) é ver barquinhos cruzando o Truk Lagoon, para cima e para baixo, com famílias indo às compras na capital. Um gasto de combustível inacreditável.
A história da Segunda Guerra no Truk Lagoon
Durante o período da 2a Guerra Mundial, os japoneses eram os donos desse pedaço de mar. O Truk Lagoon, laguna central do atol principal, tornou-se o principal porto de abastecimento dos navios de guerra japoneses. Estes navios eram portanto dali enviados ao resto do Pacífico para guerrear contra as forças aliadas.
Mas, é claro, onde você junta muitos navios, logo se torna um excelente alvo. E em 1944, os Estados Unidos bombardeou os navios japoneses em Chuuk. Foi a chamada operação Hailstone. Somando tudo, foram 44 navios e mais de 200 aviões japoneses destruídos. Toda esta destruição ocorreu apesar de os principais navios de guerra já tivessem sido evacuados para Palau. E é aí que a história de Chuuk para a gente começa.
Os naufrágios do Truk Lagoon
Por causa desse bombardeio, os navios que afundaram logo se transformaram em agregadores da vida selvagem – e o Truk Lagoon estava de repente lotado de recifes artificiais. Todos esses naufrágios japoneses sem resgate foram colonizados por peixes, corais, esponjas e afins, e o lago central, 60 anos depois do bombardeio, virou um grande jardim colorido, com a estrutura metálica dos navios servindo de base para uma explosão de vida. O Truk Lagoon se tornou a capital mundial do mergulho em naufrágios.
Mergulho no Fujikawa Maru
André mergulhou primeiro no Fujikawa Maru, o naufrágio mais popular do Truk Lagoon. Na sala de estocagem desse cargueiro construído pela Mitsubishi há vários aviões Zero praticamente intactos, além de toda a carga que por lá estava na hora do bombardeio, como munição. O navio tinha 132m de extensão, e seu fundo está sentado a 34m de profundidade – ou seja, ideal para mergulho recreacional, pois a estrutura das cabines fica a uns 9m de profundidade, rasíssimo. Na proa, há um canhão, e o mergulhador pode visitar a sala de máquinas, a cabine de comando, banheiros, cabines de tripulantes… enfim, uma verdadeira exploração do naufrágio a fácil acesso de quem quiser se aventurar.
Mergulho no Shinkoku Maru
Outro naufrágio que merece atenção é o Shinkoku Maru, que está praticamente intacto e é considerado o mais bonito (subaquaticamente falando) da região. Dentro dele, ainda existem todos os apetrechos de cozinha: talheres, fogão, utensílios, etc. o que o torna uma fotografia fascinante do momento do bombardeio.
Paraíso do mergulho
Mas nem só de naufrágios vive o turismo de mergulho em Chuuk.
Há no Truk Lagoon uma área chamada Shark Reef, onde alguns tubarões moram. Nadam por lá em qualquer época do ano que você caia na água. São tubarões-de-recife, quase dóceis, e você mergulha com vários deles ao mesmo tempo – e eles não estão nem aí pra você, como a maior parte dos tubarões naturalmente bem-alimentados que se prezam. Uma festa total e um mergulho excelente.
Além de todo esse mundo subaquático lindo, que torna a paisagem de Chuuk uma pequena jóia do Pacífico repleta de histórias pra um viajante curtir e contar. Uma boa dica para quem quiser se aventurar em mares “bastante dante” navegados, principalmente se você for um ávido wreck diver.
Tudo de bom sempre.
P.S.
- Os naufrágios podem estar ameaçando o ambiente de Chuuk, principalmente do Truk Lagoon. Mas o problema diplomático é mais complexo do que aparenta. Afinal, os navios lá afundados ainda pertencem ao Japão, embora estejam em águas de outro país. Só o Japão, em tese, pode autorizar qualquer mudança. Complexo.
- Há um navio japonês naufragado em Chuuk chamado… Rio de Janeiro Maru! O mais legal é que esse naufrágio é um dos lugares onde mais se vê tubarões no Truk Lagoon, de acordo com relatos de operadoras. Navio Maravilha, agregatório da beleza e do caos. 😀