Em novembro passado, estivemos André e eu em Maragogi pela primeira vez. Já conhecia Alagoas de outras viagens na infância, mas a Maragogi era a primeira vez que ambos íamos. E estávamos ansiosos. Afinal, o que lia pela internet era o quanto o recife de corais de Maragogi era lindíssimo, o tanto que sua fauna era riquíssima, e sua água morníssima e de cor belíssima, principalmente nas galés. Um lugar superlativo, tudo indicava.
Está ali a maior barreira coralina da costa brasileira, supostamente uma das maiores do mundo, então fazia sentido que o lugar fosse tudo isso mesmo. E para nós que amamos os corais do mundo, a oportunidade de ver – e fotografar – de perto os corais da nossa Costa dos Corais brasileira era especial. Eu estava portanto super-animada.
A cidade de Maragogi em Alagoas
Chegamos a Maragogi numa tarde de novembro. Fomos direto para nossa pousada, a Portal de Maragogi. A pousada é pé na areia, simples e eficiente. A maré estava vazante, e a extensão de areia enorme da praia a transformava em campinhos de futebol para diversas turmas. Inúmeros vendedores ambulantes e pessoas passeando ao entardecer. Uma atmosfera pacata relax deliciosa. Aquela costa de Alagoas é realmente a mais linda do Brasil, hands down. A cor da água, gente!
No calçadão de Maragogi, minha fraqueza: tapioca nos mais diversos gostos e estilos. Depois de traçar um pratão de vatapá, ainda sobra um espacinho para a tapioca, claro. E vamos dormir cedo que no dia seguinte tem o encontro esperado com os corais de Maragogi!
Melhor período para o passeio às Galés
O passeio às famosas Galés de Maragogi e outras piscinas naturais da área é o carro-chefe do turismo na região. Sempre se faz apenas na maré baixa. É fundamental, portanto, olhar a tábua de marés – é ela que determina o horário do passeio. No dia em que lá estivemos, a maré baixa era às 9 da manhã. Então no dia seguinte pegamos um barco a motor credenciado logo cedo, e fomos visitar as Galés.
Regras do passeio das Galés de Maragogi
O passeio às piscinas naturais da região é bem regulamentado pelo governo local e de Alagoas. O que é excelente, pois pode significar que há todo um trabalho de conservação e manutenção adequada dos corais e do ecossistema da região, e de reestabelecimento das áreas degradadas. Algumas das regras:
- paga-se uma taxa de conservação para visitar as piscinas naturais;
- os turistas só podem ir até as piscinas naturais na maré baixa;
- há dias em que o passeio não sai, para que o ecossistema “descanse”;
- os barcos têm um limite de passageiros e tempo nas piscinas naturais;
- há um barco oficial de fiscalização nas piscinas naturais durante todo o passeio, para evitar que barcos não-credenciados comecem a super-lotar o local;
- ao fazer snorkel ali, não se pode usar nadadeiras, para evitar quebrar os corais sem querer;
- é proibido alimentar os peixes e outros membros da fauna, assim como pisar nos corais.
Além disso, pelo menos no barco onde estávamos, os guias reforçaram a regra de não encostar em hipótese alguma nos corais e nos peixes. Achei ótimo.
Ainda assim, pelas fotos que eu tinha visto pela internet, já esperava que o lugar estivesse relativamente cheio de gente. Entretanto, a maioria das pessoas chega ali e fica perto da área de ancoragem, onde o fundo é de areia, curtindo a água quentinha e a piscina natural. Então decidimos colocar a máscara e o snorkel e nos direcionarmos, baseado no tempo que teríamos ali, para áreas um pouco mais distantes daquele amontoado de gente.
E aí é que fiquei boquiaberta.
Logo no início, os corais estavam completamente cobertos por algas – sendo asfixiados, ou já mortos. Poucos peixes.
Parênteses
É engraçado, porque havia lido que a quantidade de peixes era o que mais impressionava as pessoas. Mas acho que “muito peixe” é uma expressão que depende da sua experiência pessoal. Para um ecossistema saudável, a quantidade de peixes, assim como as espécies que vi ali me assustou. Praticamente só herbívoros, pouca diversidade, e a maioria dos indivíduos arredios, exceto os que obviamente se aprochegavam por estarem ~condicionados~ a serem alimentados. O que sugere que, apesar das regras, algumas pessoas ainda alimentam os peixes.
Os corais de Maragogi sufocados
Achei que esta situação triste era apenas ali, perto de onde os barcos atracavam. Mas que nada: continuando o snorkel até a área mais funda e com menos gente, onde algumas empresas fazem o “mergulho” autônomo, a situação dos corais era praticamente a mesma: tirando uma ou outra colônia de coral-fogo (é uma espécie bem mais resistente mesmo), o emaranhado de algas cobria toda a formação coralínea dos cabeços.
Por que os corais de Maragogi estão danificados?
A água naquela região da costa de Alagoas sempre foi um pouco mais quente. Portanto os corais de Maragogi provavelmente se adaptaram e se tornaram resilientes à temperatura um pouco mais elevada da água. Minhas hipóteses, portanto, eram várias.
1) A temperatura do mar da região aumentou além do que os corais estão acostumados (como consequência das mudanças climáticas, como vem acontecendo pelo mundo).
2) O impacto do turismo ainda é muito elevado, e a regulamentação precisa ser mais rigorosa ainda (menos pessoas por dia, talvez…?).
3) Poderia ser de que a área ainda não se recuperou de décadas anteriores de exploração pesqueira dos peixes maiores. Afinal, sem as espécies-chave de uma cadeia alimentar saudável para manter o recife de coral, a comunidade biológica se esfacela, como o que a gente viu ali embaixo d’água.
4) Pode também ser uma situação temporária – embora minha experiência vendo outros corais do mundo tende a acreditar que a situação ali está nos minutos finais mesmo.
Não sei qual delas é a hipótese mais provável para tal situação deprimente dos corais. Mas desconfio que uma combinação de todas elas é a resposta mais adequada. Ou seja, os corais de Maragogi gritam por socorro devido a diversas ameaças.
Um aperto no coração
Snorkelei pelo tempo nos dado nas Galés. Além disso, descansei bastante nas águas das piscinas naturais de Alagoas. Que são sim, morníssimas e lindíssimas vistas de cima, perfeitas para fotos no instagram. Mas a constatação da realidade dura e crua de que aqueles corais podem estar – se já não se foram… – em seus dias finais me entristeceu imensamente.
Eu adorei a cidadezinha de Maragogi, e quero incentivar as pessoas a visitá-la, por seu povo adorável de simpático, pela tranquilidade de sua praia, pelas comidas deliciosas – e principalmente porque a comunidade depende do turismo e as alternativas a ele ainda são escassas na região. O dano econômico de não irmos mais a Maragogi seria trágico.
Mas não posso deixar de expressar também o aperto no coração que Maragogi me trouxe. A profunda preocupação pela situação de seu ecossistema. Principalmente, pelo futuro que vem para estes arrecifes, em uma região que depende dele economicamente (situação que se repete por tantas outras áreas de corais do mundo). Estes pensamentos me deixaram com a triste constatação de que talvez eu tenha visitado as piscinas naturais e os corais de Maragogi em Alagoas tarde demais.
Um lastimável exemplo do que é e será o turismo em tempos de mudanças climáticas.
Nem sempre tudo de bom.
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