por:
Lucia Malla
Amazônia, Brasil, Comportamento, Memes, listas & blogagens coletivas, Sexta Sub
Publicado
05/09/2008
A vitória-régia (Victoria amazonica), como devem saber, é a flor-símbolo da floresta Amazônica. A foto dessa flor de vitória-régia particularmente não é das mais bonitas. Mas representa bem a situação geral do que vem contecendo à Amazônia como um todo. Diversos pontinhos queimados, um viço que aos poucos se esvai. Mas que ainda insiste em ser belo até o último respiro.
Para o dia da Amazônia, esta flor de vitória-régia é a imagem perfeita para a reflexão.
Amazonian way of life
A Amazônia não é a minha “praia”, no sentido literal e no sentido figurado. Dou meus pitacos aqui e acolá sobre os problemas da floresta, mas tenho plena consciência de que são isso aí apenas: pitacos. Há intenção sincera de compartilhar informações lidas, vistas e/ou ouvidas. Mas não há a menor possibilidade de solucionar os problemas da Amazônia assim.
Porque para enfrentar tais problemas, são necessários muito mais que pitacos: precisa de vontade política, incentivo à educação dos moradores da própria região, entendimento das complexidades da floresta (que são enormes). Viver o Amazonian Way of Life.
Viva a Amazônia
Exatamente por saber que as complexidades que o tema “Amazônia” traz à qualquer mesa de discussão (política, econômica, ambiental, social), às vezes me incomodo com alguns textos e spammails que circulam por aí. Vozes inflamadas, querendo cegamente salvar aquele pedaço de floresta, gritos vindos de pessoas que nunca viram sequer um pé de açaí, ou entraram na mata para entender sua giganteza. Soa extremamente utópico, e utopia não resolverá as questões pertinentes da Amazônia.
(Toda vez que leio textos assim, aliás, lembro de uma cena de , em que o personagem sabichão de Matt Damon é lindamente pelo personagem de Robin Williams.
“So if I asked you about art, you’d probably give me the skinny on every art book ever written. Michelangelo, you know a lot about him. Life’s work, political aspirations, him and the pope, sexual orientations, the whole works, right? But I’ll bet you can’t tell me what it smells like in the Sistine Chapel. You’ve never actually stood there and looked up at that beautiful ceiling; seen that.“
A importância da experiência pessoal
Por isso valorizo muito os discursos em primeira pessoa, feitos por quem está (ou esteve) lá, que felizmente os tempos de internet nos permitem acesso. Porque esses discursos são providos de mais realidade e menos utopia – mesmo que escritos na forma de posts lights num blog. São o retrato da vida cotidiana na maior floresta tropical do planeta.
Antes dos blogs, eu já ouvia discursos assim de pessoas próximas. Do Lucio e suas aventuras atrás de abelhas pelas florestas do Acre. Ou do Bião e seu amor pelos macacos, especialmente o uacari de Mamirauá. Também do Bill, um gringo que mora no Amazonas e faz mais pela Amazônia que qualquer outra pessoa que conheço. E o melhor de todos, da minha querida sogra, que se embrenhou incontáveis vezes descalça pela floresta à procura dos lagartos que estudava. Esses são relatos que mostram uma realidade mais pé-no-chão do que lemos em geral na mídia, bombardeada que está por delírios de “internacionalização” em entrelinhas pegajosas.
A minha experiência na Amazônia
Eu também já estive na Amazônia.
Uma vez só, em Mairauá, uma reserva de desenvolvimento sustentável administrada em boa parte pelos ribeirinhos. Mas é exatamente por ter ido apenas uma vez que falar sobre a Amazônia me incomoda. Não me sinto confortável de maneira alguma para palpitar seriamente sobre o tema. O máximo que a gente faz é distribuir informações e fomentar discussões, tentar conscientizar pessoas que um problema grave de administração e ambiente existe por aquelas bandas, mas mais que isso realmente não dá. Porque em uma única ida, vi outras nuances que pouco conhecemos, diluídas que estão no discurso chavão de proteção a qualquer custo.
Inclusão
Numa das conversas que tive com a Alline lá em Mamirauá, ela me contou que na primeira oportunidade que surgiu, os ribeirinhos, com o lucro que ganharam na reserva, compraram uma TV de plasma para a comunidade deles. Afinal, tudo que eles queriam era “inclusão brasileira”: assistirem às mesmas novelas, ouvirem o Galvão Bueno narrar os jogos de 4a à noite, darem “boa noite” ao William Bonner todo dia. E inclusão social, se sentir brasileiro como a média, a TV de plasma, no barraco de palafita, psicologicamente trouxe.
As pessoas que estão na região Amazônica querem desenvolvimento – sustentável ou não. Porque desenvolvimento significa na cabeça deles (e da maior parte dos seres humanos do planeta…) melhoria de vida. E quem não quer melhorar, né?
Por isso que meu pitaco-mor (além de ficar distribuindo informações sobre o tema sempre que cabe) é a necessidade de se educar os moradores da região, principalmente aqueles que estão em contato direto com a floresta, para as complexidades do local em que estão. Tratá-los com dignidade e respeito, como cidadãos brasileiros que são e compartilhar a informação que pesquisadores, ambientalistas e afins geram na teoria. Afinal, são esses moradores locais que cuidarão na prática da Amazônia. Não os que a defendem fervorosamente do sudeste, que no máximo cuidam dela na teoria… Se os habitantes locais estiverem munidos de informação, leis contextualizadas (e não viajantes na maionese…) e recursos bem-administrados, o benefício que a utopia dos demais sonha pode ser alcançada. Podemos enfim salvar a floresta que nos é tão querida.
Tudo de bom sempre.
P.S.
- Se você curte arqueologia, na Scientific American há uma reportagem sobre a rede de cidades que existia na Amazônia antes da chegada dos europeus no século XV.
- Esse post é dedicado a todos os que passam por aqui e são da região coberta pelo tapete verde que é a Amazônia. É gratificante ler o que vocês têm a contar sobre a vida nas cidades do Norte. Também faz parte da blogagem coletiva do Faça a sua Parte para o dia da Amazônia.
- Além da flor de vitória-régia, outros posts da Sexta Sub você encontra aqui.
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