A notícia me chegou via um link que a Deise me deixou no twitter: a Tailândia proibiu o mergulho autônomo em certas áreas submersas já bem castigadas do país. No link que a Deise deixou, um título pra lá de exagerado, em minha opinião; já na reportagem do Daily Mail, um pouco mais de informação.
Fuçando na internet, achei a lista dos points que foram fechados. Um total de 22 locais, alguns dentro de parques nacionais. Entre eles, alguns points das Ilhas Similan, famoso destino de mergulho. É o que está mostrado aí na foto da Sexta Sub.
Os dois (ou mais lados) da proibição ao mergulho na Tailândia
Há dois (ou mais) lados nessa moeda. Como bióloga, muito me incomoda realmente a situação dos corais em alguns locais populares de mergulho, como é o caso da Tailândia, de Cozumel e da Flórida. São visitados pesadamente por milhões de pessoas por ano como em Hanauma Bay aqui no Havaí, que recebe cerca de 1 milhão de pessoas por ano. É muita gente pra um recife de coral não tão vasto. Em lugares assim, se não houver um controle bem rígido da visitação, os danos ao ecossistema são fatais.
O impacto do turismo é nítido: basta olhar para a cara dos corais. Em Hanauma Bay, onde vamos mais (algumas fotos aqui), a área mais rasa onde 90% dos turistas ficam quase não tem mais corais vivos, só peixes e tartarugas. Mas basta nadar um pouco mais pra fora da baía e você começa a ver os corais vivos, saudáveis, mais coloridos. Eles estão mais pro fundo, porque as pessoas não querem nadar tanto, né? Menos gente = corais mais saudáveis. Uma equação simples. Hanauma é super-bem administrada. Fecha um dia por semana pro recife “respirar”, por exemplo. Tem fiscais no pé o tempo todo. Então, imagina se não fosse assim…
Oportunidade para educar
Entretanto, como mergulhadora, também não consigo minimizar a oportunidade educacional do mergulho recreacional. A maior parte dos mergulhadores que conheço relatam ter se tornado mais interessadas em questões de preservação do ambiente marinho depois que viram de perto a beleza do fundo do mar – ou seja, depois que mergulharam.
Este é um efeito formiguinha, que vai de um em um, mas querendo ou não, colabora pra uma amplificação da mensagem de que precisamos cuidar melhor dos oceanos do mundo. Porque não há melhor forma de entender a delicadeza desse ecossistema do que perceber o quão frágil é uma anêmona ou uma ascídia, o quão dependente da saúde geral da água ao redor esses animais são e o quão interligados um ao outro, formando uma verdadeira rede de conexões pela vida, eles estão.
Eu sei que há mergulhadores que, por falta de controle de flutuabilidade ou por ignorância mesmo, encostam nos corais, quebrando os mesmos com suas pé-de-patadas, ou coletam conchas, corais e afins para levar de “souvenir” – tudo isso atitudes reprováveis – mas se colocarmos na balança, o ganho educativo de entender este ecossistema tão vital pesa mais, em minha opinião.
O mergulho não vai acabar
Por isso, acho que o título do post do Tripbase blog um pouco exagerado – o post em si até explica melhor, mas mesmo assim, é misleading. O mergulho não vai acabar, até porque os danos da atividade causados por mergulhadores são bem localizados, alguns spots mais populares pelo mundo, que devem ser uma porcentagem bem pequena da cobertura de corais geral.
Os maiores danos aos corais advindos do homem nem resvalam no mergulho; são a sobrepesca, o despejo de resíduos industriais e de esgoto no mar, a poluição plástica, o aquecimento global. Em pouco se relacionam com “ir lá ver o coral ao vivo e a cores”. O mergulho como atividade de lazer deve, sim, se tornar mais controlado, regulamentado, e essas mudanças podem vir num futuro próximo.
Acho ótimo que mudanças venham para melhorar a qualidade de vida dos corais. Principalmente, para minimizar os “casos-problema”. Como de gente ajoelhada em coral (como já vi uma vez). Ou de mergulhador se arrastando pelo fundo, carregando consigo toda a fauna do substrato. Isso inegavelmente tem que acabar.
Precedente aberto
Num outro lado da moeda, os destinos cuja economia depende do mergulho (Filipinas, Palau, Cozumel, por exemplo) devem também começar a melhorar a administração de suas áreas, aumentar a fiscalização fora e dentro d’água. Isto caso percebam que seus corais estão sofrendo com o impacto humano da atividade. Em diversos lugares do mundo, aliás, os divemasters já são incentivados a reportar mergulhadores que estejam causando danos ao ambiente, ou atormentando animais ou perturbando o fundo do mar. (Em Cozumel, por exemplo, na teoria é assim.)
Acho que essa atitude se tornará cada vez mais difundida, à medida que o impacto aumente em cada local específico. Assim como a atitude de proibir mergulho em certas áreas visando sua recuperação, para quem sabe depois reabertura ao público de uma forma mais equilibrada e administrável.
Há um meio-termo possível, que não proíba totalmente nem libere sem regulamentação alguma. Que preserve o cunho educativo e prazeiroso da atividade diminuindo os danos ao ecossistema. Tal meio-termo passa necessariamente por certas restrições, que devem ser analisadas com bom senso, dependendo da saúde da fauna local e do número de bocas que dependem da atividade para a sobrevivência no dia-a-dia.
Tudo de sub sempre.
P.S.
Neste artigo já citado lá em cima, sugere-se também que tal medida foi tomada na tentativa de recuperar os corais das Ilhas Similan. Primordialmente, para que eles possam entrar na lista de Patrimônio da Humanidade da UNESCO. Isto aumentaria o aporte de verba internacional para o local, sua “vendabilidade” futura, etc. Aliás, essa história de patrimônio mundial é tão cheia de meandros que gera papo pra muitos posts, viu… Mas fica pra depois. Me cobrem.