Passei o último fim-de-semana assistindo televisão, num descanso osmótico merecido há tempos. De posse de tanto tempo livre em frente à telinha, não pude deixar de reparar nas peculiaridades dos canais da TV coreana que assistimos aqui na terra de Confúcio. Os que conseguimos entender, é claro.
Dos canais de TV aberta, nada posso dizer: não os assisto. A não ser por um programa de comédia pastelão com uns caras muito engraçados, que são uma espécie de mistura de Cassetas com Trapalhões, visto que suas palhaçadas parecem ter uma certa ingenuidade – digo parece, porque não entendo: dou risadas como se estivesse assistindo a um filme mudo pastelão.
Canais de filmes
A TV a cabo que assinamos, embora seja o plano básico, possui 5 canais de filmes – todos legendados em coreano. Como entendo 2 línguas, na prática significa que somos reféns de Hollywood. Só me recordo neste 1 ano de Coréia de ter assistido a um filme francês, o “Amélie”, e de ter passado por um filme alemão que até parecia interessante, mas como já se foi o tempo em que eu conseguia falar ou me expressar na língua de Goethe, deixei de lado. Ah!, e outro dia de madrugada passava um filme meio pornochanchada com tomadas no Brasil e participação do Milton Gonçalves – deu pra entender algumas frases ao fundo em português. Mas de resto, só assistimos a filmes em inglês.
Entretanto, os canais de filme até que são bons, se avaliados como mero geradores de entretenimento. Descobrimos, por exemplo, que os coreanos AMAM James Bond, pois todo fim-de-semana passa pelo menos um filme do 007. Nessa contabilidade, acabei completando minha coleção de “assistidos” do agente secreto britânico mais famoso. Fora os especiais mostrando todos os bastidores possíveis e imagináveis de 007, prato cheio pros fãs.
Existem 2 canais japoneses no nosso pacote de cabo. Na atual conjuntura do “imbroglio“ que a política anda aqui, não sei como ainda estão no ar. Canais chineses, alguns, mas muitos filmes chineses nos outros canais – infelizmente, não consegui assistir a um filme que parecia engraçadíssimo com Jackie Chan e Lucy Liu em som “original”. Uma pena.
TV coreana-americana
Mas há bizarrices na TV. Por exemplo, o canal AFN (American Forces Network), um canal militar americano, cuja função máxima parece ser fazer com que os americanos que aqui residem sintam-se na sala de TV de sua casa em Ohio, Kentucky ou Texas. A programação é toda uma lavagem cerebral militar, e os intervalos são todos recheados de propagandas-babás, que ensinam os militares a tomar conta de seu dinheiro, de sua família, de suas viagens, etc. Principalmente, mostram que o governo está sempre correto ao enviar os soldados pros confins do planeta para lutar: tudo pela liberdade, não é mesmo?
O mais engraçado desse canal é na hora da previsão do tempo, quando eles mostram o mapa da Ásia e Oceania. Ao invés do nome dos países, estão o nome das bases americanas, ou apenas as cidades onde há bases. Assim, as Ilhas Marshall, coitadas, viram um “país” chamado Kwajalein, e por aí vai. Embora um canal lavagem cerebral, é nele que assisto a alguns adoráveis enlatados.
Ligue djá!
Outra bizarrice é a quantidade absurda de canais de venda de produtos… bizarros! Propagandas de vaso sanitário, de aparelhos de ginástica, de calças impermeáveis, de tacos de golfe, de cortadores de frutas, entre outras, são as que reinam. O que leva uma pessoa a comprar um vaso sanitário pela TV? Faço-me essa pergunta, mas já penso na resposta. Porque se está sendo apresentado ali, uma coisa é certa: é porque alguém compra.
E novelas. Como coreano adora uma novela! As de época, parecem fazer bastante sucesso, porque são várias. Todas no melhor/pior estilo Globo, e principalmente, lançadoras de modas e modismos. Lembro que uma aluna vietnamita da minha aula de coreano lá no Hawaii justificou no primeiro dia de aula sua intenção de aprender coreano para que pudesse entender as novelas daqui. O professor olhou para ela com aquela cara de “tem louco pra tudo no mundo…”.
Canais em inglês
Existe ainda um canal coreano só em inglês, o Arirang. Esse é pra mim o canal mais interessante, não só por que eu entendo, mas pela proposta do canal: mostrar a vida coreana na chamada “língua mundial”. Mostram de tudo: esportes, notícias, programas de auditório, aulas de coreano, curiosidades, etc. Fico me perguntando se tal iniciativa faria sucesso no Brasil – as comunidades estrangeiras que aí habitam iam gostar, com certeza.
O Arirang passa um programa de esportes em que já vi até os gols do meu Fluminense querido – quando nos EUA eu cheguei a ver na TV esse fato??? Nunca! Eles também têm um convênio com a BBC e com o Deutsche Welle. Então um pedacinho da visão européia da vida contrabalanceia o “brainwash” do AFN. Good deal.
Minha reclamação desse pacote de cabo fica pela ausência de um bom canal de desenhos animados. Sou uma viciada em desenhos. No Brasil, a TV da casa onde morava, se eu estava em casa, estava ligada no Cartoon Network, eu devorando o Laboratório do Dexter, as meninas Super-Poderosas, Johnny Bravo, e todos os demais feitos pelo Tartakovski. Em Boston, minha maior alegria foi quando conseguimos enxergar na velha TV o Nickelodeon, e eu pude passar a tomar meu café-da-manhã assistindo ao Pinky & Cérebro: que inspiração para quem ao desligar a TV ia viver a realidade de um laboratório com camundongos transgênicos! Fora os clássicos Tom & Jerry, Popeye, Corrida Maluca… Enfim, sou louca por desenho animado, e aqui, o único que eu semi-vejo é o Bob Esponja (que também adoro!) – semi-vejo porque é dublado em coreano.
Meu predileto
Mas foi neste fim-de-semana de overdose de TV que eu percebi algo: em matéria de interesse pessoal, aqui na Coréia, nenhum canal me é mais querido que o National Geographic. Aliás, no Brasil, eu já era uma piolha de Discovery Channel. Nos EUA, a PBS até me conquistou, mas eu sempre fiel, terminava assistindo aos documentários instigantes que só a National Geographic sabe produzir. Na sexta, vi um documentário sobre um vulcanólogo francês que estava estudando o Nyiragongo, ativo na República do Congo.
Aquilo é amor à pesquisa: o cara foi coletar amostra de lava a 1,000 graus dentro da cratera em erupção! E falando assim: “I think I can get a little bit closer…” Mais perto e o cara morre! Assisti àquilo como se fosse a um filme, tamanha a tensão que aquela saída de campo me trouxe. (Só por curiosidade, o Nyiragongo afeta a menos de 50 km a cidade de Goma, com 500,000 habitantes, cujo deslocamento é/foi uma complicação política daquelas.)
E aí vieram os documentários de vida selvagem. Ah! Como eu os adoro! Fazem-me sonhar com a próxima viagem, com os bichos e plantas que ainda quero ver, com a causa ambientalista, com tudo que há de bom e melhor no mundo. Vimos documentários sobre focas e pinguins da Antárctica, jacarés africanos, tubarões pelo mundo, morcegos, peixes camuflados… enfim, uma infinidade zoológica, exemplo digno do que é a tal diversidade da vida que Darwin falava. Ou a explicação de porque a vida é realmente MARAVILHOSA…
Tudo de bom sempre.