…e já que anteontem a Sexta Sub contemplou os golfinhos, resolvi continuar no “tema” e comentar sobre uma atividade “polêmica” que acontece por aqui. Direcionada aos turistas visitantes do Havaí, acontece num resort no South Shore de Oahu. O resort oferece aos visitantes em seu laguinho a oportunidade de nadar com golfinhos nariz-de-garrafa – por um preço bem elevado. Algumas vezes por dia, os golfinhos são levados a interagir com pessoas dentro da água, crianças e adultos, enquanto a platéia fica assistindo por trás da cerca.
Dentro do laguinho, uma guia/instrutora de animais coordena as ações que os golfinhos apresentarão e sugere o que as pessoas devam fazer para obter resposta do golfinho. É um exercício de interação entre humanos e animais, com o adendo de que o bicho é mais “selvagem”, portanto há mais “emoção”.
Confesso que nunca tive ânimo ($$) para me engajar em tal desventura; sempre fico só assistindo – acreditem, é beeeeem cara a brincadeira. Mas toda vez que assisto tenho a sensação de que a animação entre as crianças é total. Por isso, não me surpreendi quando li há um tempo atrás sobre a existência de algo chamado “terapia assistida com golfinhos“. Direcionada para crianças com problemas crônicos psíquicos, como autismo, seria uma alternativa ao tratamento convencional. E é aí que mora o problema.
Ao se apregoar a terapia com golfinhos como alternativa a um tratamento convencional (este último provavelmente um tratamento que foi testado e comprovado que funciona por muitos anos de estudos), a polêmica começa. O site que traz informações sobre a terapia tem um forte cheiro de pseudociência e/ou de forçação de barra. De acordo com eles, seria uma excelente substituição (ou auxílio) à terapia com animais que já é praticada (nesse caso, com animais de estimação, principalmente cachorros). Estudos científicos analisando a terapia com golfinhos não encontraram diferença significativa na melhora do paciente – não difere, por exemplo, de umas boas férias ou interagir com um cãozinho. Ou seja, tem efeito placebo.
Veja bem, por mais que se queira que os golfinhos tratem uma criança doente (e é um sentimento totalmente entendível se você é pai e/ou mãe), há um abismo entre a relação de uma pessoa com um cachorro e a relação de uma pessoa com um golfinho. O fato do animal ser selvagem, de estar ali por condicionamento total ao alimento, e não à pessoa, podem fazer a diferença em diversas questões, inclusive as serem tratadas pela terapia (como laços afetivos). Outro fato é que o golfinho, durante as “sessões”, está confinado, o que já é por si só um stress, enquanto um cachorro, estando perto do dono, já não é tão afligido pelo confinamento de uma sala ou um quarto.
Em minha opinião, a atividade com os golfinhos não passa disso: uma atividade. É divertido? Sem dúvida. E toda vez que se faz algo divertido, é muito provável que você sinta bem-estar. Mas nadar com golfinhos não deve ser elevado à categoria de terapia para uma patologia, não pode substituir um acompanhamento de perto com um psicólogo/psiquiatra e muito menos ser a única opção terapêutica de uma criança com problemas psíquicos crônicos ou graves. Deve ser encarada apenas como uma atividade complementar, já que as crianças (e as crionças de mais de 18…) efetivamente ficam animadas ao ver o bicho – isso é um fato.
O resort aqui no Hawaii não propagandeia a atividade como terapêutica. Mas interessantemente, as meninas que são “instrutoras” são a maioria estudantes de psicologia. No dia que fui lá observar, ouvi uma delas comentando com um pai sobre o quão bem à mente da criança faz estar ali com golfinhos. Não duvido. Mas acho que nunca se deve esquecer o bom-senso de lado nem se segurar em “curas milagrosas” que podem no final das contas até prejudicar o andamento normal de um tratamento. Encaremos a realidade: nadar com golfinhos no contexto de um resort, é apenas mais uma (irresistível) brincadeira de criança.
Tudo de bom sempre.
**************
– Valeu, Doni, pela ótima conversa e pelos insights sobre a terapia no MSN! 🙂