
“Sinais de Lisboa”, pintura em azulejo de Cecília de Sousa feita em 1988.
Quando comento com as pessoas que estive em Lisboa e não vi o céu azul, muitos se espantam. Porque aparentemente Lisboa é famosa por seus dias ensolarados. Mas, além da gripe horrorosa que me acometia, a chuva não parou em meus 4 dias pela capital. De modo que tive que priorizar visitas a lugares fechados, com pouca caminhada pelas ruas da cidade.
O Oceanário era um lugar na minha lista de pontos a visitar com chuva ou com sol. Mas a minha ida ao Museu Nacional do Azulejo foi uma dessas serendipidades de viagem. Apesar de realizada apenas porque chovia canivetes em uma das minhas tardes na capital portuguesa. Além deste museu estar relativamente perto de onde eu estava hospedada em Santa Apolónia. Foi uma deliciosa surpresa, entretanto.
A arte do Azulejo em Portugal
Como o nome diz, o Museu do Azulejo em Lisboa é dedicado à arte de pintar em cerâmica para revestimento de paredes. Uma arte que os portugueses principalmente dominaram no mundo – e ainda dominam. O prédio em si onde ele está instalado já é uma jóia. De arquitetura colonial clássica portuguesa, era o antigo convento da Madre de Deus. Andar por seus corredores me lembrou demais diversas construções equivalentes no Brasil. Em 1980, depois de negociações com o governo, se tornou o Museu que hoje existe.

Um dos padrões azulejeiros do Oceanário de Lisboa.

O poeta-fingidor em azulejo. Pintura de azulejo feita por Júlio Pomar para revestir a estação Alto dos Moinhos, em Lisboa.
Mas o que primordialmente me impressionou no Museu foi aprender sobre a dimensão da arte azulejeira em Portugal. Azulejos de todas as formas, estilos e tamanhos. Dos mais intricados aos mais simples, dos mais coloridos aos mais sombrios. E principalmente, percebi que a arte azulejeira, longe de estar morrendo, se mantém firme e forte na cultura portuguesa. Afinal, a seção de azulejos modernos foi a que mais me impressionou, pra ser sincera.
O Museu faz um trabalho excelente em mostrar seus azulejos de maneira didática. Com uma certa temporalidade mas não demais. Há espaço também para azulejos holandeses, flamengos, etc. E além dos azulejos em si, há também peças de decoração e faiança na coleção.
Roteiro da minha visita ao Museu do Azulejo em Lisboa
Comecei a visita pelos azulejos mais antigos, aqueles tradicionais pintados em azul. Aqui, certamente, lembrar dos azulejos portugueses que vemos pelo Brasil é inevitável. Há ainda assim uma capela/igreja dentro do Museu, com painéis de azulejo e afrescos muito bonitos. Me lembrou, contudo, o interior das igrejas mais famosas brasileiras.

A ala moderna dos azulejos.
Portugal é um país conhecido por seu bucolismo e melancolia. Não sei dizer se foi porque chovia horrores. Ou se porque os corredores imensos daquele ex-convento me impressionaram. Ou se por ver azulejos de alguma forma me remete a locais bucólicos do Brasil. Mas o fato é que na parte do museu com as peças mais antigas, senti uma certa melancolia no ar.
Toda aquela arte azulejeira, tão bela e rebuscada, me transportou em resumo para uma era de colonialismo. Que, hoje sabemos, não foi das mais felizes para todos os brasileiros. Enfim, a carga histórica existente em minha cabeça e atachada às peças ali mostradas era muito pesada para ser ignorada.
Mas aí começamos a entrar na modernidade. A impressão que tive foi de que a decadência portuguesa como nação navegadora trouxe um repensar artístico. Este repensar se revelou no design do azulejo tradicional. Além de associado à todo o movimento modernista da mesma época, claro. As peças de azulejo modernas são provocantes. Trazem um frescor ou uma crítica ao ambiente em suas linhas e entrelinhas desenhadas.
O grand finale
A visita termina na sala em que está exposição um painel enorme feito em azulejos. O painel retrata a cidade de Lisboa no ano de 1755. Este painel é realmente o ápice da arte azulejeira portuguesa. Sua exposição como grand finale torna o entendimento da arte azulejeira mais contundente ainda. Afinal, saímos de azulejos modernos para esta volta ao passado. Fica a sugestão de que o passado está ali como inspiração para o novo, o ousado, que vem por aí.
Na saída do museu, pausa para um café. Ou um suco de laranja de verdade (coisa rara onde moro nos EUA) com um cálice de vinho verde. Enquanto esperava a chuva dar uma amenizada… A cafeteria de decoração azulejada rústica, numa tarde chuvosa, foi um convite perfeito à abraçar a melancolia portuguesa. Principalmente quando ela vem embalada para presente em forma de azulejo.

Na cafeteria, azulejos temáticos. (Fora estes assentos com cara de salaminho…)
Amei o museu. Recomendo muito a todos que forem à Lisboa. Gastem sem receio umas horinhas de visita a essa jóia do país, que exalta tanta conexão com nossa própria história.

A grande vista panorâmica de Lisboa antes do terremoto de 1755. Produzido no início do século XVIII, é afinal uma das grandes expressões desta arte portuguesa.
Tudo de bom sempre.
Para visitar o Museu do Azulejo
O Museu Nacional do Azulejo fica na Rua da Madre de Deus, 4, 1900-312 Lisboa. Os ônibus 718, 742, 794 e 759 para em frente ao museu.
- O Museu fica aberto de terça a domingo, das 10:00 às 18:00. O ingresso custa 5 euros. Estudantes e pessoas acima de 65 anos têm desconto de 50%.
- Minha visita ao museu foi de aproximadamente 2 horas. Acho que é tempo mais que suficiente para ver tudo, mesmo se você é um calouro da arte azulejeira.