Tour Na Zona Desmilitarizada (DMZ)

por: Lucia Malla Ásia, Coréia do Sul, Política

Como já havia citado anteriormente, a Coréia do Sul é um país acessível apenas por mar ou ar, embora esteja numa península no nordeste da Ásia. E esse impedimento de acesso por terra dá-se pela razão mais simples (ou complexa, como preferirem o nível da discussão) do mundo: o vizinho de cima é a Coréia do Norte. A única forma de, pelo sul, vermos um pouquinho do Norte é fazendo um tour na Zona Desmilitarizada na fromteira dos dois países, a DMZ.

Desde o armistício da Guerra da Coréia na década de 50, a península está dividida em duas. Armistício pois em tese a guerra não acabou ainda, não houve um tratado de paz assinado muito menos uma rendição de um dos lados. Numa maneira grosseira de ver a situação, este armistício representa a última fronteira da quase extinta Guerra Fria: o vizinho do Norte comunista, e a “ilhada” Coréia do Sul, capitalista.

Fronteira da Coréia do Sul e Coréia do Norte - Tour na Zona Desmilitarziada (DMZ)
Entre cercas de arame farpado duplas, uma guarita vigia a fronteira da DMZ do lado sul-coreano.

Como chegar

Ponte da Liberdade - fronteira entre Coréia do Sul e Coréia do Norte
A chamada “Ponte da Liberdade”, por onde em tese os norte-coreanos ganhariam a liberdade – tenho certeza que o Bush adora esse nome de ponte…

De posse dessas informações geopolíticas básicas, acrescido do fato de que o vizinho do Norte decidiu sair das conversações de desarmamento sobre seus brinquedinhos nucleares há 2 semanas sem mais nem menos, partimos sábado passado para um tour na Zona Desmilitarizada (em inglês, DMZ), região de 5 km de largura na fronteira das duas Coréias.

Em Seul, disseram-nos que a única forma de visitar a região era com este tour de um dia. Mas depois percebemos que esta informação era uma meia-verdade, pois todos os micro-ônibus de tour param numa estação chamada Imjingak, e agrupam-se em alguns poucos mega-ônibus, que terão permissão para entrar a área. Em tese, você pode pegar um carro ou trem e chegar até esse ponto, comprar ingresso pro ônibus “agregador” e visitar a DMZ. Embora chamada de Zona DESmilitarizada, é muito bom lembrar que a região está sob comando militar 100% do tempo. Portanto, você está sendo SEMPRE vigiado por um rifle. Ou seja, nada de gracinhas.

Enfim, decidimos fazer o tour empacotado, que embora de natureza essencialmente política (ninguém vem pra DMZ achando que vai ver castelos e pessoas descontraídas ou uma natureza maravilhosa, né?), estranha pela ausência de discussão. As informações são passadas pelo guia com zelo e sem excessos. Imprensei à beça o coitado com inocentes perguntas socio-econômico-políticas de curiosidade mallística. Depois fiquei pensando que, se um daqueles meus companheiros de excursão/soldados americanos fosse um agente da CIA, pode ser que eu nesse momento esteja sendo perseguida por sei lá o quê sem nem saber! 😀

Como é o tour na Zona Desmilitarizada

De Imjingak, o mega-ônibus começa a andar e você passa por um posto militar, onde obrigatoriamente mostra o passaporte (sim, parece que estamos saindo do país, mas não estamos), e entra na DMZ propriamente dita. O tour é bem restrito. Como tudo ali é área militar, poucas “atrações” são visitadas, e em boa parte delas você é proibido de tirar fotografias. O ápice do tour é andar por um dos túneis que foi encontrado no fim da década de 70 e estava sendo escavado pelos norte-coreanos para uma futura invasão do Sul. Um túnel super-úmido, baixinho e fundo, bem fundo. Ao total, até hoje descobriram 4 túneis na fronteira, e o exército sul-coreano/norte-americano estima que hajam mais uns 20 por aí. Uma peneira, essa DMZ.

Do observatório de Dora, a Coréia do Norte

Observatório de Dora - Tour na Zona Desmilitarizada (DMZ) - entre Coréia do Sul e Coréia do norte
Soldados no Observatório de Dora, de onde ficam de butuca nos vizinhos do Norte.

Do túnel vamos pra o Observatório de Dora, onde podemos ver a mais alta bandeira hasteada do mundo (da Coréia do Norte, é claro). Além disso, vemos também a cidade-propaganda da Coréia do Norte. Esta é uma cidade toda falsa, pois ninguém mora lá. Mas era usada no passado para “atrair” sul-coreanos que quisessem mudar-se para a “tranquila e feliz vida” no vizinho do Norte. Dá pra ver também um pedaço da terceira maior cidade Coréia do Norte, e a cidade de Panmunjom, onde as negociações de paz são feitas. As fotos dessa vez são permitidas, mas altamente monitoradas. De ângulo algum você consegue registrar a enorme cerca de arame farpado da DMZ. Além disso, precisa de uma lente telefoto daquelas pra conseguir enxergar qualquer coisa do lado de lá.


Find best Korea tours, experiences and tickets to top attractions

Na estação de Dorasan

E a última parada do tour é na estação de trem de Dorasan, que está sendo construída pela Coréia do Sul para, no evento de uma possível reunificação, ligar Seul à Europa, por trem através da Trans-Siberiana. Já pensou? Eu vou querer fazer essa viagem!! E a primeira parada depois de Dorasan será… Pyongyang, a capital da Coréia do Norte!

Carimbo de passaporte - Zona Desmilitarizada
Carimbo da estação de Dorasan no passaporte, simbólico da ida ao DMZ.
Soldado na estação da Zona Desmilitarizada - DMZ - rumo a Pyeongyang - Coréia do Norte
Próxima parada: Pyongyang! No dia que um trem sair com esse destino da estação de Dorasan, o mundo com certeza será um lugar melhor, e teremos mais esperança no futuro…

Política, afinal

Enfim, depois de dar adeus a essa região tensa e problemática, como boa “malla” não consegui ficar sem discutir política. Me fiz várias outras perguntas, e conversei com André, e li um pouco mais. Sabemos que os coreanos querem no fundo a reunificação, a ninguém interessa isso mais que eles. Mas a situação na península é delicada, pois reunificam-se, e aí? Sob que regime político? Aceitar o capitalismo bushista é a última coisa que o seu Kim do Norte quer – e com uma certa razão, viu… E a China, nessa história toda? É o país que mais ajuda financeiramente a Coréia do Norte, em troca de… sabe-se lá o quê! (Aliás, os brasileiros podem visitar a Coréia do Norte entrando pela China, nunca pela Coréia do Sul. Americanos, NEVER NEVER.)

Fato é: o cara tem um exército enorme (de famintos) e a única arma que ele tem pra não ser escrachado, escurraçado da mesa de negociações do planeta são as bombas nucleares. Enquanto a prepotência do discurso da D. Rice continuar imperando, Seul continuará em alerta, visto que é o alvo perfeito (13 milhões de habitantes!) para um devaneio neurótico do “Grande Líder”.

Tudo de bom sempre. Assim espero.

P.S.

  • O dono da Hyunday é norte-coreano. Não sei se ele fugiu ou migrou simplesmente pro Sul de alguma forma. Mas foi ele quem financiou a construção da rodovia conectando as duas Coréias, por onde a Coréia do Sul envia diariamente muita comida, medicamentos e materiais de construção para os “irmãos” do Norte.
  • Durante o feriado de Ação de Graças (que aqui é em setembro), as famílias separadas pela política podem se rever por três dias. Esse encontro intercala entre Seul e Pyongyang a cada ano. É a única chance para muitos de rever familiares próximos. A TV adora ficar no ar com cenas de choro entre famílias…
  • Se você está interessado em ver um bom filme sobre a situação das Coréias, veja “JSA – Joint Security Area”. Filme do sul, que assisti com legendas em inglês. Fala de neutralidade, e é um soco no estômago pros dois lados dessa moeda corroída.
  • O lado bom da DMZ: como a região está intocada a mais de 50 anos, cheia de minas terrestres, os únicos que têm passe-livre são animais e sementes de plantas. Várias espécies ameaçadas estão tranquilinhas da silva, crescendo e se multiplicando nesse mega-parque ecológico forçado…
  • Para mais posts sobre a vida e os passeios na Coréia do Sul, clique aqui.


Booking.com



1204
×Fechar