Quando criança, nos idos da década de 80, adorava ler e reler (e achava surreal) uma crônica de Carlos Eduardo Novaes com esse título inusitado: “Aeroporto de Congonhas: Uma, Duas, várias vergonhas”, parte do livro “O Caos nosso de cada dia”, escrito em 1976. Nela, Novaes transformava em comédia da vida cotidiana as agruras de quem tentava viajar por esse aeroporto, morava ao redor do mesmo ou trabalhava naquele pandemônio. Acho que Novaes nunca imaginou o quão realista e trágica aquela inocente crônica se tornaria 30 anos depois de sua publicação. Para tristeza de uma nação.
Meus votos de pêsames aos que perderam amigos, parentes e amores nesse acidente revoltante.
(Para leitura de um texto primoroso sobre o caos aéreo brasileiro e esse acidente trágico, sugiro este. Não precisa concordar com tudo, apenas perceber o quanto o sistema aéreo brasileiro anda manco. E para viajantes como eu, isso é um problema a se pensar muito.)
No dia 04 de julho passado, eu estava dentro de um avião da TAM que pousava em Congonhas, na nova pista, exatamente na direção que este fatídico vôo 3054 tentou pousar, voltando do plériplo norte/nordeste que fizemos. O dia estava claro, com uma massa de poluição densa sob São Paulo, como é de costume infelizmente no inverno. Por sorte, não chovera. No momento da descida, o máximo de incidente que houve foi uma mulher encrencar porque eu usava minha câmera fotográfica para tirar fotos da cidade, como sempre faço em vôos diurnos (“porque era digital”, essa foi a explicação que ouvi, esquecendo das leis básicas da física eletromagnética). Acho que problemas muito mais graves estavam ali sendo expostos, naquela descida, para pilotos e tripulantes, do que as imagens pueris saídas da minha máquina. Viajar pelo Brasil de avião virou esporte radical. Tristeza sem fim.