Em nosso segundo dia nos perdendo pelas ruas de Londres, tínhamos mais uma vez apenas o primeiro destino certo: queríamos presenciar a tradicionalíssima troca da guarda no Castelo de Buckingham. Afinal, vir a Londres e não ver os tais guardinhas com chapéu de casa de marimbondo é quase o mesmo de ir ao Rio e não visitar Copacabana.
Para chegar até o castelo de Buckingham (que, aliás, não é dos mais bonitos que já vi), fomos até a estação Green Park e ao sair, atravessamos o Green Park que dá nome à estação, uma caminhada super-agradável em meio a árvores e esquilos. Não é difícil perceber que estávamos chegando ao palácio: a quantidade de gente (principalmente turistas e policiais, à caráter e à paisana) nas ruas, calçadas e nos portões do palácio era inacreditável. Era dia da troca da guarda escocesa, e soldados com gaitas de fole (talvez o som mais irritante do mundo para os meus ouvidos) vinham pela praça central, também lotada. Com minha estatura baixa, a primeira parte da troca depois dos portões eu simplesmente não vi, em meio a cabeças, máquinas fotográficas e celulares. Procurei diferentes ângulos, mas nenhum buraco plausível aparecia que me permitisse boa visão. Paciência. Entretanto, assim que a troca da guarda dentro da área do palácio acabou, a multidão começou a dispersar – e foi aí que pude ver finalmente os tão-famosos soldadinhos de chumbo da rainha. Eles saíram pela mesma praça central, e nesse momento, já com menos da metade do povaréu inicial, pude efetivamente aproveitar a troca da guarda.
Após o desfile, andamos em direção a uma grande avenida em frente ao palácio de Buckingham, e nos adentramos no parque St. James (que minha ignorância momentânea achava ser o Hyde Park). Nesse parque, havia um laguinho onde um grupo bizarro de pelicanos (redundância, porque para mim pelicanos e bizarrice poderiam ser quase-sinônimos) interagia com o público e com outras aves. Muitas aves diferentes, aliás; uma pequena fauna divertida para o meio de cidade em que estávamos. Um dos pelicanos era mais “aparecido” e chegava próximo à grade, sempre tentando mordiscar a comida de quem passava. Uma graça. Mas eu, com minha mentalidade maionesística, sempre me pergunto quanto será o nível de colesterol e afins no sangue dessas aves urbanas que obviamente não evoluíram o metabolismo com dieta de Cheetos de visitantes. Viagens minhas…
Os guardas escoceses da realeza britânica, deixando o seu turno de trabalho no Palácio de Buckingham. A praça já estava mais vazia nesse momento. Mas o som das gaitas de fole… ai. Abaixo, um pelicano sendo alimentado por uma criança. Pelicanos são aves muito bizarras e esse tinha uma cara de louco muito peculiar.
Andando pelo parque, tivemos visões simplesmente magníficas da cidade. Em dado momento, um castelo londrino apareceu meio que por entre árvores banhado por raio de sol, e parecia que estávamos vendo cinematografia de filme épico. Aliás, nem parecia que eu estava numa metrópole: o ar de vilarejo feudal à distância era a sensação predominante naquele momento. O cheiro e a cor das folhas ajudava um pouco nessa sensação, talvez, porque o cenário parecia de contos de fadas.
Primeiro, o London Eye visto do St. James Park, e abaixo, a visão mágica do castelo em meio ao verde do parque. Medieval, para dizer o mínimo.
Após andar por dentro do parque, chegamos a um prédio magistral onde a realeza guarda seus estimados cavalos. Sim, uma cavalaria chique, com direito a guardinha sisudo vestido à caráter século XVII e tudo. Mas o prédio é simplesmente lindo por fora. Passamos por dentro para ver o tal “guardinha da espora”, que nunca sorri ou olha para as pessoas, e chegamos do outro lado do quarteirão. A caminhada continuou pela Whitehall street e de repente, um susto: estávamos em Trafalgar Square. (E o sol aparecera!)
Sem um mapa em mãos (afinal, estávamos a fim de nos perder), eu não tinha noção de que a famosa praça estava tão perto do palácio de Buckingham. Nós terminamos fazendo um caminho mais longo, mas se pegássemos o outro lado do St. James Park, teríamos dado direto no Admiralty Arch, outro ponto certo de turismo londrino. De qualquer forma, estávamos ali, no hotspot londrino, em meio a centenas de ônibus de 2 andares vermelhos, táxis pretos enormes, aquela mistura vanguarda e classicismo que tanto cheira a Londres. A praça vibrava, embora nenhuma manifestação específica nela acontecia. O prédio do Museu Nacional em frente parecia brilhar, com sua estátua de leão. Um momento de sensações incríveis: eu estava ali, no coração de Londres, uma das capitais do mundo, berço de tantos movimentos culturais, de tanta história, e isso me emocionou.
Em Trafalgar Square compramos um sanduíche e fomos comendo pela rua, apreciando a fauna urbana. Entramos em uma rua diagonal, e de repente, André tomou outro susto: encontrara a loja da Stanley Gibbons. Para quem não curte ou não entende muito de filatelia, não passa de mais uma loja numa rua de Londres. Mas para colecionadores de selo, é a visita mais almejada que se pode imaginar. E chegamos lá por acaso – ah! as maravilhas de se perder numa cidade! Entrar na loja foi uma experiência incrível para mim, uma outsider desse mundo. Entreti-me muito vendo catálogos de selos de vida marinha das ilhas do Pacífico (cada um mais lindo que o outro), selos comemorativos de eventos esdrúxulos em países longínquos e principalmente, percebi o quão viva a filatelia ainda está no mundo de hoje – pelo menos ali, naquele endereço. Pedaço de história popular.
Após a parada na Stanley Gibbons, continuamos a caminhada e percebi o tradicional hotel Savoy e muitos teatros. Estávamos no centro nervoso da produção teatral de Londres, onde as peças famosas são expostas ao público. Respirava arte no ar, era lindo. Mais uns quarteirões andando e de repente, outro susto: chegamos em Piccadilly Circus, outro point de Londres – esse, com mais cara da Times Square novaiorquina, sem o charme histórico de Trafalgar. Piccadilly Circus estava lotada, muitos jovens e um telão enorme, ícone-mor da era cyber, piscava as marcas mais famosas do nosso tempo. Eu estava numa metrópole, e o ar de tudo-ao-mesmo-tempo-agora-aqui era o predominante naquele momento.
E vejo flores em Trafalgar Square! Ao lado, a agitação dos painéis em Piccadilly Circus, outra praça chave do dinamismo londrino.

A estátua de Darwin observa de seu patamar os visitantes que param no café do museu. Lovely!
Em Piccadilly, resolvemos pegar um ônibus vermelho de 2 andares – eles agora são híbridos, ecologicamente mais eficientes. Entramos em qualquer um que passava, subimos no segundo andar. Começava a chover, então a opção do ônibus foi acertada. Depois de um tempo nos divertindo vendo a cidade “de cima”, saltamos do ônibus e nos dirigimos a uma estação do metrô. Afinal, precisávamos voltar para casa, porque mais comemorações no Museu de História Natural Britânico nos aguardavam.
(Parênteses: tomar café no Museu de História Natural ao lado das estátuas de Darwin e de Wallace não tem preço. Pelo menos, para cientistas, como eu. Não perca o capuccino deles, é muito gostoso.)
O prédio do Museu de História Natural de Londres por si só já impressiona: um castelo de ciência.
Londres é uma festa monárquica. Ou seria anárquica?
Tudo de bom sempre.